InovaçãoNewsletterSociedade Civil Organizada

Nesta terceira edição da newsletter da Oficina Global o tema é a inovação para o desenvolvimento. Para além de um editorial da Plataforma Portuguesa das ONGD e uma entrevista com a Cáritas Portuguesa, trazemos várias reflexões para estimular o debate sobre nosso contexto atual, o papel das organizações da sociedade civil e da inovação para a transformação social. 

 

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Newsletter nº 3, Junho 2022

Inovação para o Desenvolvimento

Desde a pandemia, e agora mais recentemente com a guerra na Ucrânia, a sociedade civil tem sido colocada à prova, e o seu papel tem-se demonstrado cada vez mais preponderante na resposta às crises e à transformação social. E ainda assim, e apesar das evidências, a sociedade civil é frequentemente ameaçada, descredibilizada, ignorada e em muitos países nos dias de hoje, silenciada, e constantemente desafiada. Desafiada na medida em que os sistemas nos quais a sociedade civil opera e os princípios que advoga são colocados em causa, tal como a democracia e os processos participativos de tomada de decisão, a justiça e a solidariedade, a dignidade humana e os direitos humanos, a transparência e a responsabilização.

Ilustração (com modificações): Steve McCarthy for Fine Acts/ CC-BY-NC-SA 4.0

O contexto atual diz-nos que é necessária uma reestruturação dos sistemas económico, financeiro, político, social e ambiental que causam um aumento das desigualdades, para um investimento nos sistemas sociais, inclusivos, que verdadeiramente “não deixam ninguém para trás”. Neste sentido, é impreterível que a sociedade civil tenha atualmente um papel político, propositivo e influenciador. Deverá ir além da prestação de serviços sociais ao Estado, e procurar redirecionar as políticas governamentais para uma mudança sistémica.

O contexto demonstra que as Organizações Não-Governamentais de Desenvolvimento (ONGD) deverão ser cada vez mais incentivadas a procurar entender a sua própria capacidade e papel no contexto de um ecossistema social global, passando de uma perspetiva estritamente focada nas habilidades e conhecimentos, para a compreensão da sua capacidade em termos de função organizacional, nomeadamente através de um investimento maior na aquisição e reforço de capacidades de adequação, resposta e estruturação, mas também no campo da inovação. As ONGD devem ser capazes de investir na inovação, particularmente no que respeita as metodologias, abordagens e a emergência de novas técnicas, de novos pensamentos e culturas de trabalho, novas oportunidades de crescimento e mudança social, essenciais para a revitalização e a modernização do setor e da sociedade civil, mas também na recriação e adaptação do que já existe, criando mecanismos de disrupção e reconstrução dos sistemas onde operam.

A inovação nesta perspetiva deve ser entendida como a capacidade das ONGD serem verdadeiramente transformadoras de si mesmas e dos sistemas onde intervêm. Reconhecendo as limitações estruturais que impedem uma maior expressão do fator de inovação no trabalho das ONGD (particularmente as que se sentem em termos de financiamento, recursos humanos e estruturas formais), a inovação deve continuar a estar presente na agenda, nas estratégias e nas prioridades das ONGD, enquanto uma abordagem holística e de construção da mudança social e sistémica.

Luciana Almeida,

Plataforma Portuguesa das ONGD

Duas perguntas à…

A pandemia de Covid-19 foi um desafio que obrigou as organizações da sociedade civil a inovarem. Como foi esse momento para a Rede Cáritas em Portugal?

Na resposta de emergência à pandemia, a primeira necessidade identificada, pela Cáritas em Portugal, foi assegurar a continuidade do trabalho que a rede já realizava na sua atividade regular e que implica resposta direta a milhares de pessoas a nível nacional, em diferentes circunstâncias e enquadramentos. Entre as principais preocupações, para além da segurança ao nível da higiene e saúde, estava a necessidade de responder àqueles que não tinham nenhuma retaguarda familiar e isto foi o primeiro motor para uma primeira resposta de “inovação”.

Todo este ambiente trouxe para a nossa forma de trabalhar e de estar com aqueles a quem servimos um sentimento de proteção, mas também de grande acompanhamento. Trouxe também um sentimento de grande ansiedade para os técnicos e voluntários que sentiram a pressão de quem cuida a vulnerabilidade.

Sublinhando que de uma forma natural acaba por ser a rede mais informal a dar uma mais rápida resposta em situações de emergência, crise, etc. Foi, exatamente, o que aconteceu com a pandemia. A rede informal é este olhar de quem está próximo, que consegue ver o que está a acontecer com mais facilidade do que quem está longe e olha para as situações na sua globalidade. Consequentemente, esta proximidade acaba, necessariamente, por levar também a uma resposta mais inovadora pela urgência na mesma. Quando há uma situação de grande emergência há um estímulo à inovação.

E como vê o futuro da inovação no contexto das organizações da sociedade civil? As inovações que aconteceram em resposta à pandemia vão de alguma forma ter impacto no trabalho futuro da Rede Cáritas em Portugal?

A utilização da palavra inovação no contexto das organizações da sociedade civil representa sempre alguma ansiedade misturada (porque não!) com alguma angústia, porque a tónica que é colocada no inovar chega a ser tão “transcendente” que muitas vezes as organizações são já inovadoras na sua ação sem o reconhecerem, por parecer, sempre, que a inovação não é um objetivo ao alcance de todos. Com toda a certeza e, tal como a Rede Cáritas teve de inovar, muitas e muitas organizações da sociedade civil o tiveram de fazer e o continuarão a fazer seja em virtude de uma situação de emergência, como aconteceu com a pandemia, seja porque é inevitável no futuro, que as organizações sejam mais diferenciadas para também darem uma resposta mais assertiva nas suas áreas de atuação.

No que se refere à Rede Cáritas em Portugal, no contexto de pandemia, esta conseguiu reinventar-se e inovar na sua ação sem que em muitas situações se tenha sequer dado conta. Foi necessário encontrar formas de estar próximo quando a proximidade era o que se deveria evitar. Surgiram, então, respostas como a entrega de vales alimentares, o atendimento via chamada telefónica, a constituição de equipas de rua, a utilização de meios informáticos para manter ligações com os utentes, mas também entre equipas da Rede Cáritas a nível nacional. E estes são alguns exemplos de todos os que aqui poderiam ser discorridos e contados.

Tudo isto é um património que já está incorporado naquilo que é atualmente a forma de atuação da Cáritas em Portugal.

A resposta da Rede Cáritas em Portugal à pandemia de Covid-19 foi documentada em um estudo realizado pela Oficina Global. Sabe mais aqui!

Aconteceu na Oficina

Em destaque no blogue

Série de artigos sobre “Inovação para o Desenvolvimento”

Nesta série de artigos a Oficina Global convida-te a refletir sobre as transformações e desafios enfrentados no contexto da Cooperação Internacional para o Desenvolvimento e os possíveis caminhos para a transformação social e sistémica. A série passa por temas como complexidade, conhecimento, aprendizagem, adaptação e, claro, inovação, destacando os argumentos principais dos estudos “O Futuro da Cooperação Internacional para o Desenvolvimento: fragmentação, adaptação e inovação em um mundo em mudança” e “Inovação e Mudança nas ONGD Portuguesas”.

Ilustração (com modificações): Hust Wilson for Fine Acts/ CC-BY-NC-SA

O Futuro que prometemos às nossas meninas

A partir da sua experiência no Malawi, Michelle Chikaonda, propõe uma reflexão que amplia nossa visão sobre a violência de género, inserindo-a numa discussão sobre poder e a dinâmica desse poder dentro de um contexto social. Chikaonda faz-nos repensar porque dizemos para as meninas se esforçarem na escola se o facto de terem ido à escola não importa na nossa sociedade se não encontram um homem para validar seu valor e se, em última análise, o que a escola faz é dar às meninas a oportunidade de encontrarem um homem melhor para se casarem. É preciso fazer mais do que dizer às meninas que a escola trará coisas boas. Clica aqui para ler o artigo.

Para a vida cotidiana o que significa “promover um crescimento económico sustentado, inclusivo e sustentável”?

Com mais de dois mil milhões de trabalhadores no setor informal, o ODS 8 estabelece uma tarefa ambiciosa: promover o crescimento económico sustentado, inclusivo e sustentável, emprego pleno e produtivo e trabalho decente para todos. Para os investigadores Ruby Richardson, Kunal Sem e Michael Danquah é preciso ter uma visão mais atenta da informalidade para entender o que esse objetivo significa para a vida cotidiana das pessoas. Clica aqui para ler o artigo.

Dicas da Oficina

Seguindo o tema desta edição, reunimos uma série de dicas da nossa equipa que abordam de diferentes perspetivas e em diferentes formatos o tema da inovação.

Podcast | Nossos Saberes

A série de 10 episódios busca discutir e dar visibilidade a outras formas de viver em sociedade. As histórias contadas no podcast mostram que formas mais justas e sustentáveis de viver em sociedade não só são possíveis como também já estão a ser colocadas em prática. A série faz parte do projeto Novos Paradigmas: Para um outro mundo possível realizado pela Abong e o Iser Assessoria, em parceria com o Ibase.

Dica da Ana Luísa Silva

ONGD | Bosque y Comunidad

Conhecer o trabalho de outras organizações pode ser uma forma de encontrar caminhos para inovar. Esta ONGD localizada em Córdoba, na Espanha, tem investido em soluções baseadas na natureza que combinam técnicas tradicionais com novas abordagens em seu trabalho para melhorar as condições de vida das comunidades rurais, nomeadamente nos países em desenvolvimento.

Dica da Susana Réfega

Documentário | Trajetória de uma Missão

O documentário narra os cinco anos de atuação da Fraternidade – Missões Humanitárias Internacionais na região norte do Brasil por meio de depoimentos de trabalhadores humanitários e de pessoas atendidas pelos seus projetos. Para além de dar a conhecer a situação dos venezuelanos que imigraram para o Brasil, o documentário também é interessante porque mostra os processos de aprendizagem e aprimoramento da ajuda humanitária.

Dica da Renata Assis

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