Cooperação para o DesenvolvimentoInovação

Créditos da imagem: Gerd Altmann via Pixabay.


Pensar, fazer e aprender melhor: promover a inovação inclusiva para o desenvolvimento sustentável


Iniciamos hoje no blogue da Oficina Global uma série de artigos sobre “Inovação para o Desenvolvimento”. Queremos convidá-lo a refletir connosco, a partir dos estudos que realizamos recentemente, sobre as transformações e desafios enfrentados no contexto da Cooperação Internacional para o Desenvolvimento e os possíveis caminhos para a transformação social e sistémica. Começamos por republicar um dos primeiros artigos postados no blogue, no qual Ana Luísa Silva e Luís Pais Bernardo, investigadores do CEsA/ISEG, fazem uma introdução aos temas que serão abordados na série: complexidade, conhecimento, aprendizagem, adaptação e, claro, inovação. 


Embora seja uma noção trivial, continua a ser importante repeti-la: o desenvolvimento internacional é complexo. Não lidamos com problemas simples: os grandes desafios do desenvolvimento têm muitas causas e pouca linearidade. É por isso que são problemas complexos. E as intervenções têm, muitas vezes, resultados imprevistos. A complexidade é isto: reconhecer que um problema é multicausal e pode ser consequência de outros problemas aparentemente alheios. Robert Chambers, especialista em desenvolvimento rural e metodologias participativas, dá o exemplo da subnutrição infantil. Muitos programas de distribuição de suplementos nutricionais revelaram resultados muito aquém do esperado. Porquê? O problema da má nutrição infantil não resulta apenas de uma dieta deficitária em nutrientes variados. Também é consequência da prevalência generalizada de doenças intestinais crónicas, as quais reduzem a capacidade de absorção de nutrientes. As fracas redes de infraestruturas de saneamento básico contribuem para a proliferação destas doenças. Mas a dificuldade em mudar comportamentos de higiene e saneamento também. É um problema espinhoso (a nossa tradução para wicked problem). 

 
Ao perguntar se “podemos conhecer melhor”2, Chambers sugere que só conseguimos enfrentar este tipo de problemas se reconhecermos que participamos na intervenção – como agentes ou sujeitos – e que essa intervenção é um processo colectivo e interactivo. Isto significa que, em todas as intervenções, há epistemologias múltiplas, por isso os nossos processos de aprendizagem devem ter isso em conta. A aprendizagem reflexiva é um processo contínuo de questionamento e interacção com as realidades operacionais em que intervimos. Permite-nos abandonar a presunção de que as soluções técnicas, muitas vezes preferidas por financiadores e implementadores, são só técnicas e nunca políticas, organizacionais ou distributivas. Estas questões são fundamentais no debate da inovação e na prática da inovação inclusiva para o desenvolvimento. Dispomos de poucos recursos para criar escala ou impacto e temos aversão ao fracasso. Mas a viabilidade da inovação para o desenvolvimento depende do investimento na incerteza e na criação de espaços onde a escassez de recursos não dite o que fazemos. Usando ferramentas desadequadas à complexidade corremos o risco de, ao inovar, nos ficarmos pela simples observação “esta solução funciona ou não?”, perdendo assim o horizonte da escala e do impacto.  


A inovação para o desenvolvimento sustentável deve ser um processo multidisciplinar, em que se combinam conhecimentos e aprendizagens várias. Deve ser inclusiva, partindo da experiência daqueles que estão mais próximos dos problemas e que os vivem no dia-a-dia. Quem promove a inovação para o desenvolvimento deve assegurar que há tempo e espaço para criar, mas também para testar, falhar, iterar, aprender e crescer. Só assim exercemos verdadeiramente a reflexividade e asseguramos a emancipação daqueles que servimos, rumo a um desenvolvimento mais justo, equitativo e sustentável.   


Este texto foi originalmente publicado na revista da Plataforma Portuguesa das ONGD, nº19 (Out/Nov 2019). Leia a revista completa aqui.

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