A indústria da moda é responsável por 10% das emissões globais de CO2, mais do que o tráfego aéreo internacional. Desde 2000, a produção de têxteis duplicou e do lado do consumo entre 2000 e 2014 as compras de vestuário aumentaram em 60%. No entanto, estima-se que, anualmente, 85% de todos os têxteis produzidos acabem no lixo. Em um contexto de crise climática esses dados já são alarmantes, mas para além do elevado impacto ambiental, o setor da moda é também caracterizado por inúmeras violações aos direitos dos trabalhadores, sobretudo em países em desenvolvimento. De 91 marcas de moda analisadas pela Fashion Revolution, apenas 12% pagam aos seus trabalhadores salários acima do mínimo legal.
A produção e o consumo de moda não podem ser analisados de forma independente e do nosso lado a mudança passa por adotar um consumo ético e sustentável. De que forma isso é possível? Primeiro, questionar a necessidade de comprar aquela peça de roupa nova. Se a compra é mesmo necessária, fazer uma escolha consciente. Tens o hábito de olhar as etiquetas das roupas antes de comprá-las? Ali há informações sobre os materiais utilizados e onde a peça de roupa foi produzida – ainda que muitas vezes não remeta a extensa cadeia de produção do vestuário. As certificações também podem ajudar a fazer uma escolha mais consciente uma vez que verificam desde a produção da matéria-prima até às condições de trabalho nas fábricas têxteis. Algumas certificações para conhecer: Better Cotton, Cotton made in Africa, GOTS e Fairtrade.
A formação “Pequenos Passos para o Consumo Sustentável de Moda” buscou chamar atenção para esses aspetos. Realizada em duas edições (em setembro e outubro), aconteceu no âmbito do projeto “Pequenos Passos – por um consumo consciente e sustentável, no combate às alterações climáticas”, implementado em parceria pela FEC – Fé e Cooperação e a Oficina Global e cofinanciado pelo Camões, I.P.. Ao final da formação, houve um momento de pensar em grupo e gerar ideias para sensibilizar mais pessoas sobre os impactos da indústria da moda durante a Sustainable Week’23 no ISEG entre 24 e 26 de outubro. Entre exibição de documentários e debates, foi realizada uma campanha de coleta de roupas para doação “Dê uma segunda vida ao que já não usas” e lançado o desafio “90 dias sem comprar roupa”, ao qual pode juntar-te!
A partilha de duas participantes
Carolina Carreira e Mafalda Paradinha partilham um pouco sobre as suas experiências e reflexões sobre mudanças para um consumo mais responsável e sustentável.
Carolina Carreira
Nos dias 28 e 30 de setembro, pude participar numa formação sobre a moda sustentável. Nesta formação foram abordados vários temas, como o desastre de Rana Plaza, a globalização da indústria, as certificações existentes e a transparências das marcas. Para quem não pode agarrar esta oportunidade incrível de saber mais sobre as roupas que vestimos, isto é o essencial que deve reter: O nosso planeta não pode sustentar o modelo de negócio da Fast Fashion. Este que cria demasiados resíduos, utiliza quantidades insustentáveis de recursos e prende as mulheres num ciclo de pobreza, prejudicando os fabricantes de vestuário. É necessário sarar a nossa relação com as roupas que vestimos.
Os participantes das duas sessões organizaram ainda algumas ações de sensibilização para a ISEG Sustainable Week’23. Nesse âmbito, fui convidada a dar uma palestra no dia 25 de Outubro sobre a indústria da moda e sobre os passos a tomar para um consumo mais sustentável. Enquanto embaixadora da Remake, uma ONG que luta pela justiça ambiental e pelos direitos dos trabalhadores nesta indústria, foi uma grande honra ter tido a oportunidade de falar sobre o tema. Parte do nosso trabalho na Remake passa por educar as comunidades, pois é através da consciencialização que se podem mudar ações. É frequente dar-se exemplos poderosos como a queda do edifício em Rana Plaza ou testemunhos de trabalhadores da indústria, para incentivar à ação ou enfatizar a necessidade de uma mudança de hábitos. Contudo, na Remake gostamos de nos focar numa mensagem de esperança. Nesse sentido, para além de providenciarmos informações sobre o impacto da indústria têxtil, apresentamos passos concretos para melhorar a situação.
Acreditamos que uma parte fundamental da solução para nós, enquanto compradores quotidianos, é comprar menos, manter as roupas em circulação durante mais tempo e apoiar marcas que estejam de acordo com os nossos valores. Não podemos comprar o nosso caminho para um futuro de moda ética. Para resolver os problemas perversos da moda, temos de pressionar a regulamentação através de campanhas e da criação de coligações eficazes de cidadãos ligados ao movimento laboral. O nosso trabalho de advocacia centra-se na criação de coligações com indivíduos, empresas, organizações e sindicatos que partilham as mesmas ideias, para aprovar políticas inteligentes que inteligentes que perturbem a narrativa atual. Juntos, somos capazes de mudar corações e mentes e promover mudanças sistémicas através de legislação, campanhas e iniciativas.
Lembrem-se de que a Fast Fashion não é grátis. Alguém, em algum lado, está a pagar pelas nossas peças. Para mudar o mundo é necessário todos darmos passos conscientes em direção a uma mudança de mentalidade, longe do consumismo, que prejudica não só o planeta, mas também as pessoas.
Mafalda Paradinha
A minha participação na Formação “Pequenos Passos para um Consumo Sustentável de Moda” foi impulsionada pelo meu interesse em prosseguir uma carreira na área da sustentabilidade e pela crescente importância da necessidade de mudança muitos dos nossos hábitos diários que têm grande impacto a nível ambiental e social, como é o caso do consumo de moda.
Esta formação abordou as causas e consequências da renovação constante do nosso guarda-roupa devido à facilidade de acesso pelos preços baixos que se praticam nas grandes cadeias de fast fashion e que nos incentivam a comprar muito mais do que as peças de roupa que realmente precisamos.
A formação foi muito interativa, com várias atividades dinâmicas, inclusive um trabalho de campo que foi um choque de realidade. Estivemos nas lojas a verificar as informações que eram dadas sobre as fibras usadas nos produtos. Verificámos todas as etiquetas para descobrir a origem do produto e cadeia de valor, que é muito pouco transparente por parte das marcas, que materiais são mais comuns e a sua percentagem, o preço do produto, quantos países foram envolvidos até chegar à nossa mão, entre outros. Foi fácil de concluir que todo o processo de produção de cada peça que compramos têm muitas pessoas e países envolvidos e que o preço que pagamos não é suficiente para proporcionar uma vida com qualidade a quem as produz nem para cobrir os impactos que têm no nosso planeta. Adicionalmente, as fibras usadas são na maioria poliéster, que é uma fibra que consome muitos recursos para ser transformada em roupa e que acaba em aterros durante centenas de anos para se decompor.
Participei ainda na ISEG Sustainable Week’23, com o objetivo de dar a conhecer aos alunos do ISEG os impactos do seu consumo e incentivá-los a fazer melhores escolhas no futuro. A nossa chamada à ação parte dos 6R da moda sustentável:
Repensar – Repensa o teu consumo: a produção é ecologia e ética?
Rejeitar – Recusa a fast fashion!
Reduzir – Compra apenas o necessário e poupa recursos.
Reutilizar – Utiliza a roupa mais tempo. Compra roupa de segunda mão.
Reparar – Repara os pequenos defeitos e não precisas de comprar roupa nova.
Reciclar – Roupa no lixo: Não! Transforma-a e dá-lhe outro uso.