Agenda 2030Clima e Meio Ambiente

Foto em destaque: Ben White via Unsplash


No passado dia 6 de outubro de 2021 decorreu no ISEG a palestra “Protegendo o clima – Rumo a um futuro sustentável” da Kapuscinski Development Lectures (KDL), gerido pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento e financiado pela Comissão Europeia. Esta palestra decorre da parceria nacional que existe entre a KDL e a Oficina Global/ CEsAISEGULisboa. Contou com o professor, cientista e Diretor do Potsdam Institute for Climate Impact (Alemanha), Johan Rockström, como convidado principal, para debater os limites planetários e a importância da fixação de objetivos científicos para assegurar um espaço operacional seguro na Terra. Neste artigo, Américo Azevedo, Diogo Bugarim e Izabella Leal, mestrandos em Desenvolvimento e Cooperação Internacional no ISEG, deixam-nos as suas impressões da conferência. 


O seminário abriu com a intervenção de Sofia Moreira de Sousa – chefe da representação da Comissão Europeia em Portugal e embaixadora da UE em Cabo Verde – com o objetivo de salientar a posição forte que a UE tem tido ao longo dos últimos anos na questão ambiental. Ficou ainda realçado como a UE está pronta a investir 4 mil milhões de euros até 2027 nestas questões (30% do orçamento europeu). No entanto, ficou o aviso que esta batalha irá precisar do apoio de todos e que, novamente, os mais desfavorecidos são os que acabam por sair mais prejudicados. Este é um desafio que requer a perspicácia de todos. Tal como a senhora embaixadora referiu: “Se queres ir rápido, vai sozinho. Mas, se quiseres ir longe… vai acompanhado”.  


Johan Rockström começou a sua apresentação por explicar que, independentemente do progresso alcançado, as previsões continuam a apontar para um aumento de 2.7ºC até ao final do século XXI. O orador também mencionou que cada aumento de 1ºC gera um aumento de 7% de água na atmosfera, o que seria extremamente dramático. Isto implica o surgimento mais recorrente de eventos extremos como: secas, ondas de calor, furacões e inundações. Rockström referiu também os “super extremos” (super extremes) que tem vindo a ocorrer com mais frequência, como os exemplos deste ano na Colúmbia Britânica, devido à onda de calor que afetou esta região ou as inundações que afetaram o centro da Europa, especialmente a Alemanha.  

A parte brasileira da Amazónia ultrapassou o ponto de viragem passando de um escoadouro de carbono para uma fonte líquida de carbono. Extremamente preocupante.

Johan Rockström


Se é verdade que existiu um aumento substancial nos níveis de CO2 no planeta, isso não implica que todo o CO2 acabe por ficar concentrado na atmosfera. Rockström afirmou que 56% das emissões de CO2 por parte dos humanos acabam por ser absorvidas pela biosfera, ou seja, pelos oceanos e pela terra. Estes resultam como escoadouros (sinks), criando uma dinâmica essencial para o funcionamento da Terra. Todos os modelos criados pelo IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) acabam por dar como certo que esta dinâmica se manterá no futuro. No entanto, isto trata-se de uma visão otimista, visto que começam a aparecer falhas na resiliência da biosfera (cracks in the biosphere resilience). Johan Rockström mencionou que: “a parte brasileira da Amazónia ultrapassou o ponto de viragem passando de um escoadouro de carbono para uma fonte líquida de carbonoExtremamente preocupante.” Este exemplo surgiu de um estudo recente que demonstrou que a parte brasileira da Amazónia lançou mais CO2 do que absorveu nos últimos dez anos, algo que não esteve representado nos cenários da IPCC. Se não fosse a natureza a absorver parte do CO2 já teríamos tido um aumento de 1.5ºC na temperatura. Portanto, é óbvio que neste rumo à sustentabilidade a preservação ambiental é essencial e necessitamos de respeitar os limites planetários (Planetary Boundaries). 


Após haver exposto as evidências científicas que embasam seu argumento e justificam sua preocupação diante do futuro do clima, Rockström direcionou sua apresentação a questões de ordem político-sociais. Neste âmbito, ressaltou a importância da coordenação entre os esforços da União Europeia, dos Estados Unidos e da China, destacando o potencial efeito de transbordamento para outras regiões do mundo, de acordos selados entre estes três atores no campo da sustentabilidade ambiental. De acordo com Rockström, “a UE, os EUA e a China estão caminhando para a neutralidade climática, mas com horizontes de tempo diferentes – precisamos de cooperação.” 


Nesta discussão, enfatizou-se a necessidade de uma transição sustentável ligada ao pensamento econômico, em harmonia com a estratégia de crescimento verde, propugnada pela União Europeia, que possibilite a criação de investimentos e o desenvolvimento de tecnologias alinhadas aos objetivos da sustentabilidade. Ademais, foi discutida a relevância da adoção de uma abordagem transdisciplinar que integre, além das ciências naturais e econômicas, também as ciências políticas e sociais, com vistas a promover o avanço dos debates sobre o futuro climático. 

A UE, os EUA e a China estão caminhando para a neutralidade climática, mas com horizontes de tempo diferentes – precisamos de cooperação. 

Johan Rockström


Diante da iminência da 26ª Conferência das Partes sobre Mudança Climática da ONU (COP 26), que terá lugar entre 31 de outubro e 12 de novembro de 2021, em Glasgow, Rockström destacou algumas decisões fundamentais a serem tomadas no âmbito desta cimeira. Foi proposta, neste sentido, a realização de acordos visando à: 

  • cessação do uso do carvão como fonte energética; 
  • imposição de uma taxa sobre o carbono e; 
  • salvaguarda dos reservatórios de carbono na natureza. 


Igualmente, recomendou-se o direcionamento de recursos para: 

  • o Fundo Verde para o Clima; 
  • as soluções climáticas naturais; 
  • a compensação para os países em desenvolvimento pela rápida eliminação da infraestrutura de combustíveis fósseis e; 
  • um fundo destinado à remoção de dióxido de carbono.  


Rockström lembrou-nos, ainda, do componente juridicamente vinculante do Acordo de Paris sobre alterações climáticas, com o qual os países signatários se comprometeram a apresentar, cinco anos após o tratado, planos climáticos nacionais atualizados e cientificamente embasados. 

Foto do evento “Protegendo o clima – Rumo a um futuro sustentável”


Na parte final do evento, Rockström foi indagado pelas professoras Olívia Bina, do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, e Patrícia Melo, do Instituto Superior de Economia e Gestão da Universidade de Lisboa. Entre os pontos discutidos, destaca-se a questão referente aos ditos “limites do crescimento”, diante dos quais, Rockström salientou a importância da continuidade do crescimento econômico no Sul Global, defendendo que este aconteça por meio da utilização de energias limpas. 


A conferência do cientista Rockström foi, sem dúvida, uma mais valia para melhor compreender as questões ambientais que afetam não só o presente como o futuro. Foi possível verificar como é que o nosso planeta tem vindo a reagir negativamente às ações humanas e que para alcançar uma mudança profunda, precisamos de responsabilizar os Estados pelos seus comportamentos de forma a que estes alterem o rumo das suas posições. Só assim será possível alcançar um futuro mais sustentável. Vale a pena conferir a palestra na íntegra aqui.  

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