Direitos HumanosIgualdade de Género

Créditos da imagem: Zdravka Boudinova via The Greats (CC-BY-NC-SA)


No dia 30 de março foi apresentado, em Lisboa, o Relatório Anual sobre a “A Situação da População Mundial 2022”, no âmbito de uma iniciativa conjunta do Fundo das Nações Unidas para a População (UNFPA), da Associação P&D Factor e do Camões, I.P..


Sob o tema “Vendo o invisível: em defesa da ação na crise negligenciada da gravidez não intencional” o relatório vem mostrar-nos que cerca de metade das gravidezes são não intencionais, o que equivale a 121 milhões de gravidezes não intencionais a nível global, anualmente. Isto é, no fundo, o mesmo que dizer que “uma em cada duas gestações ocorre no corpo de pessoas que não escolheram deliberadamente a gravidez ou a maternidade, que não estavam abertas à perspetiva de ter uma criança naquelas circunstâncias, naquele momento ou com aquele companheiro”, nas palavras de Mónica Ferro, Diretora do Escritório Regional do UNFPA de Genebra.


Assim sendo, o tema deste relatório não é, como talvez se pudesse esperar, a maternidade, mas tudo o que acontece antes da gravidez. É aqui que se põe a questão, “e os homens?”.


Sendo que as mulheres não são as únicas responsáveis por decisões de fecundidade e, por isso, não devem ser as únicas oneradas com as consequências dessas decisões, este é também um assunto de homens. Afinal de contas, os homens têm um papel tão significativo nesta crise quanto as mulheres.


A gravidez indesejada não é um assunto isolado. Associa-se à saúde sexual e reprodutiva, à educação sexual e à igualdade de género, e todos eles são assuntos de Estado, de políticas públicas. Têm de ser.


Porquê? Porque se os Estados não se envolverem de forma responsável na forma como todas as pessoas são educadas para a sexualidade, vai continuar a haver mulheres para quem engravidar não é uma escolha. Porque a taxa de gravidez não intencional é mais alta nos países com menor igualdade de género. Porque mais de 60% das gravidezes não intencionais terminam em aborto – e 45% de todos os abortos realizados globalmente não são seguros.


Não terá o Estado de se responsabilizar ativamente, já que de acordo com o relatório, a falta de conhecimento e de acesso a contracetivos já não são a principal explicação para o seu não uso? Atualmente, as razões mais citadas incluem o medo e a possibilidade de efeitos colaterais, assim como o sexo pouco frequente e a oposição de terceiros.


Com base neste e noutros resultados, as principais recomendações do relatório são priorizar a prevenção e acabar com a invisibilidade deste assunto, o que faz com que uma eficiente Educação Sexual tenha de ser vista como objetivo de saúde e de igualdade de género na sociedade, de forma transversal.


E falando em sociedade, não será que também na sociedade portuguesa há trabalho a fazer? Nomeadamente no âmbito do alcance dos métodos contracetivos e no julgamento existente nos serviços associados à saúde sexual e reprodutiva das mulheres? Quantos jovens sabem que podem obter contracetivos gratuitamente nas consultas de planeamento familiar do centro de saúde? Não teremos nós que repensar a forma como a Educação Sexual é explorada nas escolas portuguesas? Será que esta solução poderá passar por encontrar uma alternativa mais eficiente na Educação Sexual Compreensiva, isto é, adaptada à idade, inclusiva e transversal, que atribui responsabilidades tanto a rapazes como a raparigas e, ainda, lecionada com naturalidade e disponibilidade para desconstruir ideias pré-concebidas e tabus?


Nota: o termo Educação Sexual Compreensiva é uma tradução literal do inglês Comprehensive Sexual Education. No entanto, outras opções também são possíveis em português, como Educação Sexual AbrangenteEducação Sexual Feminista e Educação Sexual Integral

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