Sociedade Civil OrganizadaTransformação

Este artigo foi publicado originalmente pelo From Poverty to Power. Leia artigo em inglês aqui. A tradução é da responsabilidade da Oficina Global. Créditos da imagem: fauxels via Pexels.


Consultores externos, parceiros de aprendizagem ou amigos críticos – como quer que os chamemos – raramente podem mudar o sistema ou a cultura organizacional (de aprendizagem) de fora. Então, como os consultores de Monitoramento, Avaliação e Aprendizagem (MAA) podem apoiar uma mudança real em vez de criar ferramentas ou processos que são rapidamente esquecidos sem qualquer sentimento de propriedade institucional real?


A maioria das organizações de desenvolvimento têm dificuldades em monitorar desempenho e em usar evidências para embasar decisões. Apesar da crescente atenção ao feedback dos beneficiários, agências doadoras, ONGs, implementadores e filantropos não podem depender dos sinais do mercado pelos consumidores ou investidores para corrigir o percurso, como fazem as empresas. Além disso, suas ações costumam ter pelo menos alguma motivação baseada em princípios, o que torna fácil ignorar o valor agregado de ter um plano coerente com premissas explícitas e métricas claras. Como resultado, muito do MAA na área de desenvolvimento é pobre: confundindo atividades com resultados, contando coisas sem importância como participação em eventos ou generalizando a partir de anedotas isoladas. Embora não possamos adivinhar a partir da leitura dos relatórios anuais, a maioria das organizações não percebe o quão eficazes são.


“Quem vais chamar?”


A expansão das abordagens de desenvolvimento baseadas em resultados, evidências e aprendizagem nas últimas duas décadas fez com que muitas organizações percebessem o inevitável. Elas agora estão trabalhando freneticamente para melhorar seu MAA – ou pelo menos aparentar fazê-lo para o benefício de financiadores e concorrentes. Com resultados internos limitados, consultores externos são frequentemente contratados como catalisadores, alguém que pode “consertar” o MAA.


Tradução: Uau, seu programa foi desenvolvido usando uma teoria baseada em pesquisa. Acho que o nosso é baseado no instinto/palpite de um homem rico.


É nesse momento que entram pessoas como nós: os tipos de especialistas de MAA e consultores de aprendizagem que são contratados para criar ferramentas, estruturas ou processos para uma equipe ou organização inteira. Infelizmente, nós tendemos a trabalhar melhor com aqueles que menos precisam de nós.


Quando organizações utilizam ajuda externa para resolver lacunas de MAA, é altamente improvável que aqueles acostumados ao status quo tenham sentimento de propriedade em relação às práticas importadas. Costume e hábito são motivadores poderosos e, quando novos procedimentos formais são introduzidos e vão contra a prática existente, é provável que sejam abandonados em determinado momento. Por outro lado, as organizações que já possuem uma cultura de aprendizagem em expansão provavelmente não pensarão que necessitam dos serviços de consultores externos. Isso significa que muitos profissionais de MAA continuam a vender seus serviços para clientes (falhos), com pouca esperança de criar um impacto.


As verdadeiras abordagens de aprendizagem são muito mais interativas e co-produtivas, envolvendo tanto uma mudança na mentalidade quanto uma mudança nas ferramentas.


Por que não funciona?


Frequentemente, sistemas de MAA são implementados de maneira puramente extrativa, colhendo resultados e narrativas que podem ser usados em relatórios e para arrecadação de fundos. Quando a accountability crescente é a prioridade absoluta, as organizações frequentemente adotam MAA performativo ou retroativo. É performativo quando gera a aparência de que o aprendizado é levado a sério, na medida em que as afirmações são feitas repetidas vezes em relatórios e apresentações cada vez mais chamativos. É retroativo quando o MAA consiste em estudar documentações passadas e sondar a equipe em busca de anedotas e informações interessantes que possam ser consideradas resultados. Às vezes a medição para relatórios pode se tornar obsessiva, quase ultrapassando o trabalho de implementação.


Isso não quer dizer que relatórios não sejam importantes (eles são!). Mas quando o objetivo principal do MAA é algo mais do que apenas relatar ou arrecadar fundos – como, por exemplo, aprender – normalmente é feito de uma maneira diferente. As verdadeiras abordagens de aprendizagem são muito mais interativas e co-produtivas, envolvendo tanto uma mudança na mentalidade quanto uma mudança nas ferramentas. A introdução de uma agenda de aprendizagem só pode ser bem-sucedida se fizer parte de um processo de gestão de mudança mais amplo: um repensar de cima para baixo das capacidades e cultura da equipe, práticas cotidianas e o que é considerado “o trabalho” para pessoal que normalmente não fariam “a coisa de MAA” (afinal, James Bond não escrevia relatórios).


Tanto os consultores de MAA quanto as organizações que os contratam sabem que é importante o sentimento de propriedade para fazer mudanças significativas e sustentáveis. É por isso que estamos vendo nos termos de referência de consultores e nas propostas de financiamento uma crescente ênfase em como o sentimento de propriedade pode ser fortalecido ou introduzido: abordagens participativas, reuniões de consulta, oportunidades para feedback, dentre outros. Mas o resultado final é o mesmo: ferramentas ou processos de MAA ainda são frequentemente criados principalmente por pessoas externas e, então, entregues à equipe do programa para serem “apropriadas”.


Então quando e como isso funciona?


MAA precisa ser parte da visão, estrutura e processos organizacionais.


É uma questão de momento.


O desafio do sentimento de propriedade é mais fácil de enfrentar durante uma conjuntura crítica, como revisão estratégica ou processo de reorganização interna, quando quase tudo está temporariamente instável e há um consenso sobre a necessidade de mudança. Durante essas conjunturas críticas, hábitos e costumes existentes já foram desafiados, e ainda não há propriedade para uma visão clara ou um novo organograma. A fluidez nas metas e práticas torna mais provável que novas ideias sejam aceitas.


E sobre opções personalizadas, adequadas à finalidade e co-elaboradas.


Tradução: Não se pode simplesmente trazer um “parceiro de aprendizagem”.



Não contrate consultores de MAA para vender-lhe ferramentas ou dizer-lhe o que fazer. Contrate-os porque precisa de um amigo crítico no caminho da mudança organizacional. Aproprie-se, então aprenda – não o contrário.


Para que o apoio externo tenha impacto, deve ser dado o acesso e espaço necessários para entender a identidade e as necessidades de uma organização. A complexidade inerente à uma equipe instável exige ferramentas e processos sensíveis e adaptados ao contexto, em vez de produtos de MAA prontos para uso. Os especialistas de MAA não devem se comportar como vendedores ou palestrantes motivacionais, mas como amigos críticos: forasteiros de confiança que podem acompanhar uma organização durante um momento crítico, co-desenvolvendo ideias, testando-as e repetindo o que funciona. Eles devem avaliar qualquer MAA já existente – formal ou informalmente – e construir sobre isso, identificando ineficiências que podem ser abandonadas e aprimorando gradativamente o que já funciona.


Em última análise, trata-se de compreender os limites do que as pessoas externas podem fazer.


Consultores e parceiros de aprendizagem raramente podem mudar um sistema de aprendizagem ou cultura organizacional – simplesmente não funciona assim. O que eles podem fazer é interrogar as práticas existentes, apresentar novas ideias e apoiar os processos de mudança já em andamento para garantir um impacto duradouro e transformador. Eles são um multiplicador para iniciativas de mudança locais, não um substituto.


Então não contrate consultores de MAA para vender-lhe ferramentas ou dizer-lhe o que fazer. Contrate-os porque precisa de um amigo crítico no caminho da mudança organizacional. Aproprie-se, então aprenda – não o contrário.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Os campos obrigatórios estão marcados *

Enviar